Influências VI

        Voltando às influências literárias, chegou o momento de falar sobre ninguém mais, ninguém menos, do que Tolkien.



   
     Não vou falar o que todos já sabem sobre ele. Não vou falar sobre como ele conseguiu mesclar elementos de várias culturas, mitos, religiões, lendas e construir, com tudo isso, um mundo coeso. Já tem material demais sobre isso. Vou falar sobre o que as obras dele significaram para mim. Algo que apenas eu posso dizer.

    Ler o senhor dos anéis foi uma experiência extraordinária. O detalhismo da construção das cenas e dos personagens me tiraram do meu mundo. Eu era transportado para situações nas quais me senti aflito, desolado e maravilhado. Lembro até mesmo onde eu estava quando li determinadas partes, por ter de parar, temporariamente, e abandonar a sociedade do anel, imersa no perigo, para voltar para ela e perceber que minhas pausas não ajudaram a amenizar, em nada, a situação na qual os personagens se encontravam.

    Minha escrita está longe de ser parecida com a de Tolkien. Meus personagens estão longe de serem parecidos com os de Tolkien. As minhas tramas estão longe de ser parecidas com as de Tolkien. Neste ponto quero reforçar o que já foi mencionado até aqui de forma mais sutil e que neste momento alcança um nível muito mais evidente: as influências são muito mais subjetivas e indiretas do que seguir, meramente, um modelo. 

   As verdadeiras influências dos outros são as que, de fora, nos dão força para mostrar algo nosso, que já estava dentro de nós.  O que nós somos capazes de realizar.

   O que ficou da obras obras de Tolkien, em mim, e que sinto neste momento à flor da pele, numa tão feliz quanto triste nostalgia, é gratidão. E a vontade de um dia ter um selo do meu nome. Isso é verdade.



    Enquanto lia a saga O senhor dos anéis, pensava que Tolkien a escreveu para mim. Sim, sou muito egocêntrico e acho que o universo me nota nele. A saga do um anel não poderia ter chegado a mim num momento mais oportuno. Meu pai tinha acabado de sair de casa e deixar um grande fardo. Muitas dívidas. Como Frodo, não tive muitas escolhas senão encarar uma jornada perigosa.





    Nas terras desconhecidas, conheci pessoas que trilhavam, cada qual por seu motivo, a mesma jornada. Fiz amigos. Fiquei um ano inteiro trabalhando como office-boy num escritório de contabilidade. Eu já tinha diploma, em contabilidade inclusive, mas nunca tive interesse nesta carreira. Aceitei o cargo de office-boy por achar que simplesmente levaria e traria papéis. A verdade, no entanto, se revelou bem outra. Tinha de resolver casos pendentes na receita municipal, estadual, federal e outras. Para resolver as pendências de cada empresa, em cada setor do governo, era necessário entender o que se passava e como me defender, respondendo ao que os servidores públicos pediam, na maioria das vezes, por pura maldade, pois, bastava dizer certo código, em certos casos, para mostrar ao atendente que o que ele pedia não estava ali por uma razão, ao invés de ter de voltar para o escritório e descobrir que não precisava ter voltado, acumulando mais casos a serem resolvidos no dia seguinte. Foi isso que, depois de um ano, me fez aceitar a proposta de promoção para trabalhar dentro do escritório. Eu já trabalhava com contabilidade, isso era fato. E o aumento salarial fenomenal, juntamente com a certeza de poder ter, de verdade, um horário de almoço, contribuí na decisão.


    Eu não teria suportado esta jornada árdua sem os livros de Tolkien. Cada sufoco que a sociedade do anel passava, era um espelho dos meus. Da mesma forma que eu entrava no mundo de Tolkien, para, através da minha leitura, conduzir os personagens aonde eles deviam chegar; os personagens entravam no meu mundo, como se me acompanhassem, também, em minha jornada. Não vou citar todos os sinais que encontrei no livro de Tolkien -e na vida- que me faziam pensar que ele escreveu o livro para mim. Claro que escreveu para muito mais gente. O que me marcou, porém, foi o fato de que Tolkien conseguiu me alcançar através de décadas e décadas e me envolver de forma tão mágica. Podem ter sido o que chamam de coincidências. Não acredito em coincidências, porém. Tive uma mestra de matemática que me ensinou a ver que o universo não é aleatório.



    Ler o senhor dos anéis e parar para pensar na minha vida, me fez querer escrever livros que fizessem o mesmo com os meus futuros leitores. Foi a isso que Tolkien me influenciou. Mesmo que meu estilo seja completamente diferente do dele e eu seja bem mais ousado em alguns aspectos.

   Sobre os sinais nos livros de Tolkien, bem, foi algo que sempre considerei. Veja bem a palavra escolhida: considerei. Considerar algo é não colocar uma certeza. Considerar que Tolkien tenha escrito para mim é só o bom e velho egocentrismo filho de um puta que todos adoram odiar. Um tanto louco, certamente. Ter certeza disso, porém, seria loucura pura. E, nesta vida, resolvi ser apenas um tanto louco. 
   
   Seja como for, o livro me fisgou logo no início e ter chegado ao fim da jornada foi magnífico. Agradeço, então, a Tolkien, pelo primeiro, de muitos, sinais em seu livro, para mim. Qual foi este primeiro sinal? Adivinhem qual é o dia do aniversário do Bilbo? Sim, o mesmo que o meu. "Caramba, que coincidência.", pensei. Mas, até mesmo sobre a coincidência, o livro me provocava.  Como? Bem, Tolkien fez que, coincidentemente, a data de aniversário de Bilbo fosse, também, a data de aniversário de Frodo. Dali em diante, fiquei atento. E vi maravilhas. Hoje, porém, ao mencionar isso, a consideração enfraquecia. É como tentar contar um sonho. Quando falamos dele, muitos detalhes se perdem e a veracidade que estava lá até segundos atrás, parece bobagem. Mas, o que torna a vida interessante pode ser, quem sabe, a falta de certezas. O universos dá sinais, pontos, mas não traça a linha completa. Nós temos de enxergar o que não está lá através do que está. Se fizer sentido para nós; era para nós. Pensava em tudo isso, aliás, quando fui surpreendido, há poucos minutos atrás, quando, para concluir este artigo, fui pesquisar Tolkien, apenas para citar uma frase dele. Nunca tinha pesquisado antes e, como resolvi falar apenas sobre como as obras dele me atingiram, não havia necessidade de detalhes de sua vida. O que descubro então? Que um R de J. R.R. Tolkien é de Reuel. Quase Revel. O universos dá sinais, pontos, mas não traça a linha completa. Revel, para quem não sabe, é o nome que escolhi, anos atrás, para o meu grupo de teatro criado para contar as histórias da Saga do Novo Tempo. Loucura minha ver o que eu quero ver? Talvez, mas, o que torna a vida interessante, pode ser, quem sabe, a falta de certezas. Ou acreditar ou não, depende de que lado estamos no momento, segundo Tolkien. O de dentro ou o de fora. 
    
"[Criei] um Mundo Secundário no qual sua mente pode entrar. Dentro dele, tudo o que ele relatar é "verdade". Está de acordo com as leis daquele mundo. Portanto, acreditamos enquanto estamos, por assim dizer, do lado de dentro."
 John Ronald Reuel Tolkien




    Para conhecer mais sobre as obras do Novo Tempo e sobre mim, que as escrevo, explore o índice de publicações. Hasta!


William Morais

4 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Willian, vejo o Tolkien como o pai da fantasia moderna, e em matéria desse gênero literário, tenho seus livros como minhas bíblias. O mais importante é como você conseguiu combinar tantas influências díspares (de Tartarugas Ninja a Tolkien) em seu próprio exercício de criação literária e produziu frutos tão coesos e coerentes... Reflete um pouco, na minha opinião, na própria relação contextual de seus livros e suas particulares atmosferas que integram o todo de sua obra.

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  3. Mais uma vez, muito obrigado por seu comentário, sempre animador :) Hasta!

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  4. Posso dizer certamente que você atingiu um dos seus principais objetivos William, pois sua literatura não só faz parar pra pensar, ela muda radicalmente pontos de vista. Faço das palavras de nosso amigo Sagrarius as minhas, "tenho seus livros como minhas bíblias". Assim como Tolkien foi um excelente autor pra você, William Morais tem sido um autor sensacional pra mim.

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