Escrevendo sobre escrever III

    


    Escrevo, logo, sou um escritor. Isso posso afirmar. Se sou um bom escritor? Não ouso responder. Não cabe a mim, aliás. Se, de um lado acho fantásticas as histórias que conto, e por isso as conto, de outro lado sou muito crítico e provavelmente jamais as acharia prontas para apreciação dos leitores. Sou perfeccionista e longe de ser perfeito. Retocaria minhas obras eternamente. Já entendi. O esforço em me permitir torná-las públicas é enorme. Tem valido à pena, no entanto.

    Hoje em dia qualquer um pode se tornar um escrtor, mas, se manter assim, é outra história, literalmente. E isso nem sempre, ou quase nunca, está ligado ao fato de um livro ter sido, ou não, bem escrito e/ou contar uma boa história. Hoje em dia, os fatores determinantes na consagração de um escritor são inúmeros. Praticamente todo bacharel em letras, sugere, aliás, que não basta ensinar alguém a escrever, sem ter ensinado o leitor a ler, por exemplo.

    Não concordo plenamente. Admito, no entanto, considerar que a definição de bom escritor está intimamente ligada ao bom leitor. Acredito sim que o hábito de ler pode, e deveria, ser incentivado, e isso, por si só, já seria um bom caminho andado para que o leitor, se torne um bom leitor. Tudo precisa ser exercitado, para ser mantido. A flexibilidade da mente não é diferente. Escrever é apenas uma face da moeda. Do outro lado temos o ler. Os leitores são parte vital da equação para o sucesso de um livro. E, como são poucos os leitores, fica ainda mais difícil quantificar o êxito de um livro.  

    O leitores precisam ser considerados, certamente, e sempre são. O show é preparado -com muito esforço, como já mencionei em outros artigos- para os leitores. Eles precisam, porém, vencer seus próprios desafios. Ler exige certo esforço de concentração, isso é fato. O escritor conduz a cena, mas, a construção desta, está intimamente ligada a cada leitor. Cada mente tem uma capacidade específica de visualização. A capacidade de abstrair, através do foi escrito, aquilo que não foi, é também bastante individual. O escritor mostra a direção, dá um empurrão, quer dizer mais do que disse. É como se o escritor preparasse, cada vez que escreve, uma folha cheia de pontinhos numerados, para que os leitores possam traçar uma linha seguindo a numeração, a fim de encontrarem a imagem/mensagem.  E assim, invariavelmente, o escritor coloca seu coração diante dos leitores. Ele se preocupa com a quantidade de  pontinhos, para cada livro, para que não fique pesado demais e, desta forma, exasutivo; tanto quanto para que não fique leve demais e inexpressivo. Ou não, dependendo do público alvo e da intenção.

    A relação escritor/leitor, assim como o que os definem como bons ou não,  poderia ser discutida eternamente. Para mim, porém, o mais importante é funcionar. Um bom escritor é aquele que dá uma chance para os leitores terem acesso a seus livros. Os bons leitores são aqueles que dão uma chance para os escritores, lendo algum livro deles. É como um romance. Um convite para uma dança, feito pelo escritor. Precisa haver um interesse prévio, pela capa, pelo pouco que a contra capa diz, pela energia que o livro passa. E a aposta está lançada. 
    
    A mensagem de um livro será perfeita para muitos e não tanto para outros. Rotular um escritor como bom ou ruim, assim como os leitores, chega a ser bobagem. Alguns poderão achar a mensagem maravilhosa e serem tocados por ela. Outros ficarão revoltados, mas, talvez esta provocação seja intencional, também, e parte do processo da mensagem e, até mesmo aí, ou principalmente aí, o escritor terá obtido êxito. Aliás, ao meu ver, se um livro conseguiu despertar qualquer sentimento em relação à mensagem passada, deixa claro que a mensagem foi entendida. Cabe ao leitor aceitá-la ou não. Talvez a provocação seja exatamente para lembrar ao leitor que ele tem poder sobre as próprias escolhas. E ele tem liberdade para isso. Ou talvez ele só precise de tempo para entender que a mensagem era exatamente o que ele precisava ouvir e que a ajudará a entender outros aspectos da própria vida. As mensagens mais fortes, aliás, tem esta tendência. Cada um tem seu tempo.  Ao meu ver o único sinal de um livro não ter funcionado para um leitor é a indiferença. Se ele não sentir nada, aquele não é um livro para ele. Acho difícil, neste mundo vasto, um livro não ser para alguém. Estão aí tantos sucessos que, para mim, não funcionam. Apenas para mim e para a minoria, pelo visto. Para muita gente funciona e viram até filmes milionários.

    Para despedir de forma condizente, fica aí uma tirinha que encontrei - coincidentemente ou não - enquanto procurava uma imagem de liga pontos, para ilsutrar este artigo. A ilustração foi totalmente exata, mas, creio, tal tirinha, de Bill Watterson, simplesmente disse tudo o que eu disse, de uma forma muito mais simples e com seu toque tão dramático que chega a ser divertido:


  William Morais